A proliferação de dinamômetros de rolos, também chamados “dinamômetros de chassis”, torna muito prático medir a potência do veículo e compará-la com outros carros.
Muitos assumem que os resultados obtidos em um rolo podem ser comparados com os de outro rolo. Também que a potência indicada por um dinamômetro de chassis reflete a verdadeira potência do carro.
Devemos levar em conta a questão da precisão da medição e quão sensível ela é a pequenas mudanças feitas no motor.
Neste artigo, tentaremos analisar o que se esconde nas leituras fornecidas pelos dinamômetros de chassis.
Tipos de dinamômetros de chassis
No momento, existem dois tipos de dinamômetros de chassis:
Os puramente inerciais e os rolos que possuem um freio dinamométrico (elétrico ou hidráulico)
Os rolos puramente inerciais só podem ser medidos em condição de borboleta totalmente aberta, com aceleração máxima e sempre em aceleração. Por outro lado, os rolos com freio podem realizar ensaios estabilizados a RPM constante, em posições intermediárias do acelerador e até simular determinadas cargas, como as aerodinâmicas.
Como funcionam os rolos inerciais?
Os rolos inerciais estimam a energia aplicada a um volante inercial (o próprio rolo) e a velocidade com que ele é acelerado. Conhecendo a massa inercial do rolo, ele nos dirá a potência que está sendo aplicada para acelerá-lo. A partir dessa potência, outros dados são derivados, como o torque aplicado.
Os rolos inerciais só podem calcular a potência durante a aceleração. Não podem realizar ensaios sob carga constante. Isso reduz as possibilidades de uso para determinadas aplicações, como o mapeamento de injeção e avanço sob diferentes condições de carga. Também ocorre que, devido ao fato de não se poder mudar o peso do rolo, estamos sempre atrelados a uma velocidade de aceleração fixa, que depende desse peso e da potência do motor. Isso faz com que, se o rolo for muito leve ou muito pesado, não sejam simuladas as condições reais do motor, por exemplo, para conseguir pressão suficiente no turbo.
Como funciona um rolo com dinamômetro?
Neste caso, o rolo se comporta de maneira inercial durante as acelerações, mas costumam ser projetados com uma menor inércia, já que a maior parte da potência entregue pelo veículo é transferida para uma unidade de absorção de potência, como pode ser um dinamômetro de correntes parasitas ou um hidráulico. Este dinamômetro pode dissipar essa potência entregue e até mesmo opor uma resistência ao veículo de maneira que ele não acelere e permaneça a RPM constantes.
Ao mesmo tempo, esta unidade de absorção de potência realiza um torque de esforço que se opõe ao torque do veículo. Esse torque é medido por uma célula de carga, que transmite a informação para um computador. A leitura de torque e RPM nos permitirá calcular a potência absorvida pelo freio dinamométrico, que é proporcional à potência que o motor entrega (mas não é a mesma).
Há que se ter em conta algo importante, e é que a medição dinamométrica só pode ser realizada a RPM constantes. Se as RPM estiverem aumentando, significa que há uma porcentagem da potência que está sendo utilizada para acelerar as massas inerciais, pelo que essa potência não chegará ao freio dinamométrico e não será medida na célula de carga. Isso faz com que, em situações de aceleração, o freio dinamométrico indique menos potência do que em condições de RPM constantes. Os equipamentos mais modernos combinam as medições inerciais e dinamométricas de maneira a compensar esta situação e permitem obter leituras similares em condições de aceleração e de carga a velocidade constante (ou por degraus).
Qual é a diferença entre a potência indicada por um dinamômetro de chassis e a indicada por um dinamômetro de motores?
Há muitas condições que influenciam na exatidão da medição em qualquer tipo de dinamômetro, tanto em dinamômetros de chassis quanto em dinamômetros de motor:
- a temperatura da sala de ensaios
- o fluxo de ar na admissão
- a pressão barométrica
- a calibração do sistema
Mas nos dinamômetros de chassis existe um conjunto de variáveis adicionais que afetam a medição e são muito difíceis de controlar e compensar.
O fator principal é o das perdas de potência na transmissão. Por exemplo, a marcha na qual se realiza o ensaio afeta de maior ou menor maneira, sendo normalmente a caixa em direta (1:1) ou o mais próximo possível desta condição, onde menos perdas haverá na caixa. Outros fatores são a temperatura dos fluidos da caixa ou diferencial, a velocidade de aceleração e as inércias parasitas introduzidas pelos elementos de transmissão e que se somam à própria inércia do rolo, atritos dos freios, a forma como o veículo é amarrado no rolo, o peso que aparece sobre o eixo e a deformação que sofrem os pneus, por exemplo, por diferentes pesos, pressões de enchimento, diferentes materiais das borrachas, e seu patinamento no rolo.
Há uma analogia muito interessante sobre isso, e é que medir em um banco de chassis é como querer saber seu peso estando vestido.
Algumas vezes você se pesa com sapatos, outras descalço, algumas vezes de roupa íntima e outras com casaco. Nunca saberá seu peso real.
Embora os softwares façam uso de diferentes estimativas e medições adicionais, nunca será possível conhecer a potência do motor utilizando um dinamômetro de chassis, já que essas perdas não são mensuráveis de maneira exata.
Algumas pessoas utilizam uma regra que é considerar cerca de 10% da potência como perda no trem de transmissão. Mas isso obviamente é uma estimativa com muito erro, já que posso ter dois veículos parecidos, com o mesmo peso, mas um com 200HP e outro com 500HP. Utilizando a porcentagem, obterei perdas muito diferentes, quando a realidade diz que, se os veículos são parecidos, é provável que as perdas sejam parecidas entre ambos. As transmissões podem diferir em perdas de maneira abismal, tanto em sua construção e ajuste, como na qualidade de suas partes. Isso fará com que os valores de perdas também sejam diferentes.
Tentar chegar aos números do motor é uma fantasia que nos distrai de nosso verdadeiro objetivo. O objetivo é colocar mais potência no solo, e é aí onde devemos nos concentrar. Esse número podemos aumentar, melhorando a potência do motor, é verdade, mas também realizando um trabalho de otimização e melhoria nas peças que compõem a transmissão do veículo.
Se ainda assim, o que te interessa é chegar a valores de exatidão, a única forma de conseguir isso é tendo um banco de provas de motores e um rolo com dinamômetro de absorção. Seria necessário realizar um ensaio escalonado em RPM estabilizadas em ambos os bancos. Levar em conta que o fornecimento de ar aos motores seja o adequado em ambos, a temperatura do óleo e motor, as condições climáticas e as condições da sala de ensaio (ventilação e contaminação), assim como o mesmo sistema de escape e comprimento de tubos de escape. Essa seria a única forma de conhecer as perdas reais na transmissão. Complexo, não?
Quais são os principais fatores que afetam a precisão de um dinamômetro de chassis?
Há diferentes formas de ver a precisão. Por um lado, está a precisão do sistema de medição em si mesmo (sensores, eletrônica, software) e, por outro lado, estão os elementos externos que fazem com que mude a potência que chega ao solo e é medida por esse sistema de medição.
Partimos da base de que a potência lida pelo sistema é repetitiva e precisa (aqui é onde você deve averiguar qual é a marca que lhe dá essa precisão). Vamos considerar agora os elementos externos.
Dentro desses elementos, os elementos da transmissão influenciam muito em um dinamômetro de rolo. O contato entre o pneu e o rolo é o primeiro ponto onde podem aparecer erros. O tipo de borracha, seu desenho, a pressão de enchimento, o material, a temperatura da borracha podem afetar se não se for cuidadoso com as condições de teste. O peso sobre a borracha ou a tensão com a qual se amarrou o veículo farão com que se deforme mais o pneu e, portanto, consumirá mais potência, que desaparecerá da leitura final, gerando erros.
Se seguirmos em direção ao motor, fatores como o ar de admissão, tanto em vazão como em pressão, podem afetar de maneira significativa. Se os gases de escape não são evacuados da sala, essa contaminação reingressa na admissão e também faz com que o motor desenvolva menos potência. Inclusive a forma com que o condutor do veículo pressiona o acelerador pode influenciar no resultado final se não se tiver cuidado.
Na transmissão, os elementos se aquecem, o óleo se torna mais viscoso, os rolamentos vão se aquecendo.
Em veículos com central eletrônica, há numerosos pontos de controle onde intervém o computador e realiza mudanças no motor de acordo com as condições. Partindo da correção mais básica, que é o ajuste da mistura de acordo com a pressão barométrica e temperatura do ar de admissão, a outras correções como pressão de turbo, temperatura do intercooler. Hoje em dia, em veículos com controle de tração, se não houver forma de desativá-lo totalmente, em rolos de tração simples não se poderá medir adequadamente, já que detectará um patinamento nas rodas que não giram e automaticamente desconectará a potência do motor.
Por este motivo, sempre se busca realizar múltiplos ensaios no veículo para obter um perfil da repetibilidade dos testes. Se entre ensaios obtenho diferenças de 3HP, então esse é meu limite para detectar mudanças, não poderei conseguir maior precisão que essa. Quanto mais controlado estiver o ambiente e o teste, menor será esse número, mais repetitivos os testes entre si e mais finas serão as mudanças que poderei conseguir no motor. Ainda assim, é provável que mudanças pequenas, de menos de 5% da potência total, sejam difíceis de detectar nas instalações típicas, já que é difícil detectar se a melhoria se deve a mudanças reais que se realiza no motor, ou a efeitos momentâneos do ambiente ou das condições.
Quanto afeta a relação de transmissão?
Há diferenças entre marchas. Cada uma tem seu próprio momento de inércia, sua própria fricção e também haverá um efeito no deslizamento das borrachas sobre o rolo.
Nas marchas mais baixas, há uma maior redução, pelo que a caixa tende a ser menos eficiente, produzindo mais perdas e, consequentemente, chega menos potência à roda. Além disso, tende a haver mais patinamento nas rodas.
Em teoria, em qualquer marcha deveria se obter a mesma potência, mas há outro fator a se ter em conta. A velocidade com que o veículo acelera é afetada diretamente por esta relação, de modo que quanto mais rápido acelere, mais energia se necessita para fazer girar o volante do motor, e essa energia não chega à roda. Por isso é recomendável realizar os ensaios o mais próximo possível de uma transmissão em direta 1:1.
Como influem os pneus nos resultados?
Os pneus devem ser considerados como parte das condições de ensaio, e se você muda as condições de ensaio, muda os resultados do mesmo. Esta mudança pode ser desde mudar fisicamente o pneu (largura, diâmetro, o desenho, etc.), até mudar seu estado, por exemplo, mudar a pressão de enchimento ou o peso do veículo sobre o eixo. As rodas influenciam de 1 a 3 por cento do total medido.
Outro fator a ter em conta é que os pneus se expandem por força centrífuga e isto gera uma mudança na relação de transmissão total.
Como se pode mentir em um dinamômetro de chassis?
Há muitas formas, algumas são intencionais e outras fruto de más condições de ensaio. Quanto mais fatores do ensaio se controle, mais preciso será o mesmo.
Por exemplo, mudar a forma como se amarra o veículo pode afetar muito o resultado. Quanto maior força para baixo, maior deformação nos pneus e, portanto, menor potência aparecerá no solo. Mudar a pressão dos pneus, ensaiar com o motor muito frio ou demasiado quente, mudar parâmetros no software em geral, como mentir no momento de inércia, afastar ou aproximar os ventiladores do motor também podem afetar a medição.
Embora os dinamômetros que possuem freio dinamométrico sejam potencialmente os mais exatos, também são vulneráveis a alterações. O primeiro ponto a considerar é a correta calibração da célula de carga do dinamômetro.
Diz-se que os dinamômetros puramente inerciais são os mais repetitivos, já que a potência só é afetada pelo valor de momento de inércia da massa rotacional. Isso é muito certo, e realmente se podem observar mudanças muito pequenas, entretanto há que se ter em conta que repetitivo não significa exato. Isso é porque a potência indicada por esse tipo de dinamômetro, em muitos casos, não representa a potência real do veículo. Se o que se busca é precisão, os melhores resultados se lograrão em dinamômetros com freio de absorção.
Contra a crença popular, meu conselho é que desconfiem dos bancos de prova que entreguem números muito elevados. O mais provável é que seja mais exato um rolo que está entregando valores mais baixos. Sempre peçam a maior quantidade de informação da prova (condições de ensaio, temperatura, umidade e pressão ambiente, fator de correção SAE utilizado, momento de inércia do rolo). De todo modo, há que se ter em conta que os dinamômetros de rolo não servem para comparar números entre uma instalação e outra. As diferenças são importantes. O banco de chassis deve ser considerado como um elemento para realizar mudanças incrementais e ser medidos sobre o mesmo veículo, no mesmo local de testes.
Dados do mundo real
Um artigo publicado pela revista Hot Rod em maio de 2004 comparou as leituras dos principais fabricantes de dinamômetros dos Estados Unidos, medindo o mesmo veículo em diferentes instalações.
Os resultados, como era de se supor, são muito díspares entre si. Por exemplo, os dinamômetros com freio de absorção marcaram diferenças de uns 18 HP menos que os dinamômetros puramente inerciais.
Potência indicada pelo fabricante: 260HP (no motor)
Potências medidas (na roda)
- Dynapack (de absorção): 208.9 HP
- Dynojet (inercial): 226.9 HP
- Mustang (de absorção): 219.1 HP
- Superflow (inercial): 225.0 HP
Conclusões
Como pode ser visto, nem mesmo as marcas líderes em bancos de prova podem entrar em acordo sobre a potência indicada. Inclusive são valores muito distantes dos dados do fabricante. A recomendação é que sempre se realizem os testes no mesmo lugar e nas mesmas condições de ensaio. Diante desta situação, não faz sentido comparar resultados entre bancos de prova, como também não faz sentido tentar fazer com que o banco de rolos marque a potência no motor, já que é um equipamento para medir potência na roda, e a potência de perda não é mensurável (nem em um ensaio de desaceleração).
No entanto, nossa experiência nos indica que os rolos são elementos muito sensíveis e, se estiverem bem construídos e contarem com um sistema de medição de alta precisão, são capazes de medir diferenças de potência muito pequenas, o que permite fazer pequenas mudanças no motor e detectá-las. Ao mesmo tempo, é um equipamento que, por trás de um manuseio muito simples, esconde uma complexidade em todos os elementos que influenciam na potência medida, e são esses fatores onde os operadores do banco podem fazer a diferença entre uma medição séria e precisa ou uma medição aproximada que acaba gerando mais dúvidas que certezas. Quando se trabalha com ferramentas confiáveis e precisas, a capacitação e idoneidade do operador acaba sendo o elemento mais crítico do rolo.